domingo, 25 de outubro de 2009

Manifesto de Intelectuais!

Contra a violência do agronegócio e a criminalização das lutas sociais22 de outubro de 2009

As grandes redes de televisão repetiram à exaustão, há algumas semanas, imagens da ocupação realizada por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em terras que seriam de propriedade do Sucocítrico Cutrale, no interior de São Paulo. A mídia foi taxativa em classificar a derrubada de alguns pés de laranja como ato de vandalismo.

Uma informação essencial, no entanto, foi omitida: a de que a titularidade das terras da empresa é contestada pelo Incra e pela Justiça. Trata-se de uma grande área chamada Núcleo Monções, que possui cerca de 30 mil hectares. Desses 30 mil hectares, 10 mil são terras públicas reconhecidas oficialmente como devolutas e 15 mil são terras improdutivas. Ao mesmo tempo, não há nenhuma prova de que a suposta destruição de máquinas e equipamentos tenha sido obra dos sem-terra.

Na ótica dos setores dominantes, pés de laranja arrancados em protesto representam uma imagem mais chocante do que as famílias que vivem em acampamentos precários desejando produzir alimentos.

Bloquear a reforma agrária

Há um objetivo preciso nisso tudo: impedir a revisão dos índices de produtividade agrícola – cuja versão em vigor tem como base o censo agropecuário de 1975 – e viabilizar uma CPI sobre o MST. Com tal postura, o foco do debate agrário desloca-se dos responsáveis pela desigualdade e concentração para criminalizar os que lutam pelo direito do povo. A revisão dos índices evidenciaria que, apesar de todo o avanço técnico, boa parte das grandes propriedades não é tão produtiva quanto seus donos alegam e estaria, assim, disponível para a reforma agrária.

Para mascarar tal fato, está em curso um grande operativo político das classes dominantes objetivando golpear o principal movimento social brasileiro, o MST. Deste modo, prepara-se o terreno para mais uma ofensiva contra os direitos sociais da maioria da população brasileira.

O pesado operativo midiático-empresarial visa isolar e criminalizar o movimento social e enfraquecer suas bases de apoio. Sem resistências, as corporações agrícolas tentam bloquear, ainda mais severamente, a reforma agrária e impor um modelo agroexportador predatório em termos sociais e ambientais como única alternativa para a agropecuária brasileira.

Concentração fundiária

A concentração fundiária no Brasil aumentou nos últimos dez anos, conforme o Censo Agrário do IBGE. A área ocupada pelos estabelecimentos rurais maiores do que mil hectares concentra mais de 43% do espaço total, enquanto as propriedades com menos de 10 hectares ocupam menos de 2,7%. As pequenas propriedades estão definhando enquanto crescem as fronteiras agrícolas do agronegócio.

Conforme a Comissão Pastoral da Terra (CPT, 2009) os conflitos agrários do primeiro semestre deste ano seguem marcando uma situação de extrema violência contra os trabalhadores rurais. Entre janeiro e julho de 2009 foram registrados 366 conflitos, que afetaram diretamente 193.174 pessoas, ocorrendo um assassinato a cada 30 conflitos no primeiro semestre de 2009. Ao todo, foram 12 assassinatos, 44 tentativas de homicídio, 22 ameaças de morte e 6 pessoas torturadas no primeiro semestre deste ano.

Não violência

A estratégia de luta do MST sempre se caracterizou pela não violência, ainda que em um ambiente de extrema agressividade por parte dos agentes do Estado e das milícias e jagunços a serviço das corporações e do latifúndio. As ocupações objetivam pressionar os governos a realizar a reforma agrária.

É preciso uma agricultura socialmente justa, ecológica, capaz de assegurar a soberania alimentar e baseada na livre cooperação de pequenos agricultores. Isso só será conquistado com movimentos sociais fortes, apoiados pela maioria da população brasileira.

Contra a criminalização das lutas sociais

Convocamos todos os movimentos e setores comprometidos com as lutas a se engajarem em um amplo movimento contra a criminalização das lutas sociais, realizando atos e manifestações políticas que demarquem o repúdio à criminalização do MST e de todas as lutas no Brasil.

3 comentários:

Unknown disse...

Ainda que não sejam proprietários das terras invadidas, os produtores de laranja tinham a posse do imóvel, e o MST praticou ato ilegal de todo modo.

Há somente uma suspeita ou indícios de que não sejam proprietários, isso não dá legitimidade ao MST para o ato.

Apoiar o MST é se posicionar em contrário ao direito de propriedade, ao cumprimento de contratos, à estabilidade econômico, e ao desenvolvimento econômico nacional. E a defesa dessas instituições não vão de encontro à reforma agrária que aqui é defendida, mas esta deve OBRIGATORIAMENTE ser precedida por prévia e justa indenização.

Dennys Lucas disse...

olá Jair,

o problema da legalidade é barrado nos termos de uma lei que tem seu tempo histórico bem delimitado e seus atores bem alinhado com uma concepção de sociedade. Eu acredito que existe direito para além do que está escrito em nossas leis, e portanto a jurisprudência tem de dar conta desta possibilidade, e posso ter a certeza que não sou o único a pensar desta forma, e tenho encontrado respaldo jurídico para assim pensar.

Acredito ser vazio pensarmos em legitimidade qndo nos amparamos somente na lei, apesar de imaginar que socialmente o ato do MST tbm não tenha tomado a simpatia da maioria, mas é necessário e imprescindível tornar claro quais são as condições que levam tais sujeitos a chegar a estas atitudes, de maneira elas ocorreram e em que situação...

Sobre a "obrigatoriedade ser precedidade por prévia e justa indenização", para uma Reforma Agrária, devo lembrar que os habitantes que aqui estavam quando chegaram os portugueses, holandeses, franceses, espanhóis, etc, nada receberam a não ser justeza do chicote e a obrigatoriedade de renegar seu estilo de vida, e da terra ora coletivizada o impedimento de prover de comida aos seus...

Há direito para além da Lei!

abraço pelo comentário!

jair disse...

O direito está bem além das leis, isso é indiscutível. Por isso mesmo utilizei o termo legitimidade, e não legalidade.

A aplicação do devido processo legal ao processo de desapropriação para fins de reforma agrária é previsa na Constituição, e não nas leis do passado que fala.

Se há 100 anos atos semelhantes aos do MST não eram condenáveis, e hoje a maioria reprova as medidas desse movimento, isso demonstra que a sociedade tem evoluido, respeitando os direitos individuais.

Desse modo, defendo a opinião de que a medida do MST, sob qualquer ponto de vista, é ilegal e ilegítima.

A luta pela reforma agrária, e pela extinção dos latifúndios improdutivos, deve continuar, mas de maneira adequada ao Estado democrático de Direito.

Parabéns pelo Blog, precisamos conhecer entendimentos de todas as formações possíveis!